color bars (2012) / Tokyo Jihen

SAYONARA-NOSTALGIA
4 min readJan 18, 2022

Consegue ouvir o som de uma geração acabando?

2012 foi meu primeiro ano oficialmente formado na faculdade. Foi também o ano em que os maias teriam previsto que o mundo iria acabar. Era nesse clima de incerteza e pastiche de fim de mundo que o quente janeiro de dez anos atrás se apresentou para mim. Durante todo o mês, eu realizei entrevistas de emprego em escritórios um pior do que o outro, até eventualmente ser contratado no local mais horrível e insalubre da região metropolitana de São Paulo. Toda vez que era confrontado com a pergunta implícita “e o que você pode nos oferecer de vantajoso?”, eu repassava na minha cabeça que tipo de qualidade teria que vender para me enquadrar naquele lugar.

O sinal do intervalo soou pela última vez, e eu senti mais uma infância dissolver na minha frente.

O fim do Tokyo Jihen estava planejado há pelo menos dois anos, mas é indiscutível como pegou a todos de surpresa, fazendo o site oficial sair do ar no momento do anúncio. Bom, nós vamos lançar um mini álbum, algumas coletâneas, fazer uns shows e é isso. Adieu. As coisas que são transitórias são minhas bonitas, porque você tem que aprender a apreciá-las enquanto ainda existem.

É estranho essa relação de luto quando uma banda acaba. Mesmo que não surja mais material original, a discografia lançada sempre permanecerá disponível. A música não desaparece. Penso que é inevitável ficar triste pois junto com a banda parte da gente também tem fim — a empolgação de um novo lançamento, a alegria de uma música inédita, tudo isso não acontece mais. A ausência se torna o mais presente. De certa forma, quem éramos quando escutamos aquelas músicas pela primeira vez acaba junto.

Kon’ya wa karasawagi

Esse é o espírito da faixa de abertura, ‘Kon’ya wa karasawagi’ (título traduzido oficial: ‘Beacoup de bruit pour rien’, nosso bom e velho ‘Muito Barulho por Nada’ [importante ressaltar que até o momento eu nunca li Shakespeare]). Ringo evoca as mudanças de uma Tóquio que parece a cada dia menos o refúgio dos sonhos adolescentes, sabendo que reclamar sobre isso faz parte de envelhecer.

Cada álbum do Jihen tem como título um gênero de programação televisiva, então nada mais apropriado do que encerrar com color bars. Fim de transmissão. Cada uma das cinco faixas foi composta individualmente por um dos cinco integrantes, mostrando a matiz de cada um e o que eles têm a oferecer. É uma ideia simples, mas que ressalta o talento de todos, bem como sua subjetividade.

Não acho que focar faixa a faixa seja a melhor maneira de resenhar um álbum — foco no individual com perda de vista no geral -, mas nesse caso é meio impossível deixar de cotejar as diferenças daquilo que cada um apresenta. Izawa traz um mamãe-quero-ser-visual-kei (algo a que ninguém deveria aspirar) e o clima segue esfriando com mais uma baladinha do Kameda sobre… implorar por mais um tempinho pra viver ao lado daqueles que a gente ama? Exortar os outros a aproveitar o momento é um motif clássico, mas não funciona quando a Ringo canta com voz de bebê forçando um sentimentalismo que simplesmente não está lá. Desculpa, Kameda.

Se você inverter meu sobrenome e suprimir a primeira letra, o resultado será sa_i_ta, algo de que me orgulho muito. A faixa do Ukigmo é aquilo que esperamos dele e mais: dançante, sexy, venha aproveitar comigo que sua flor está prestes a de_sa_bro_char. É o ponto mais alto do álbum.

Honto no tokoro

Chegamos ao final com a primeira e (até então) última faixa composta pelo baterista Toshiki Hata: ‘Honto no tokoro’ ou ‘Actually’. A inspiração da música foi ter presenciado um gatinho ser atacado e devorado por um gavião no quintal da casa dele — ninguém quer morrer, afinal de contas. Ninguém quer morrer!, ele canta desesperado enquanto os instrumentos ao redor crescem e o engolfam, forçando-o à resignação.

O fim chegou.

Arranjei meu primeiro emprego pós-faculdade e, vivenciando o fim do Jihen, levava no meu iPod apenas músicas deles. Conforme subia e descia as ruas do Centro da cidade os ouvindo dentro de um ônibus abafado, me perguntava o que estava acabando para mim também, e o que seria do futuro. A gente reclama o tempo todo da faculdade e, depois que ela termina, não dá mais pra se esconder sob o título de estudante. Você precisa saber o que está fazendo e dar passos conscientes e definitivos. Não tem volta.

Oito anos depois, o Jihen voltaria, porém. O color bars permanece até hoje um ponto fora da curva na discografia da banda, um álbum em que todas as fichas foram jogadas pro alto, ressaltando quem compôs o Tokyo Jihen. Existe um certo charme em encerrar algo — o fim não precisa ser sempre assustador. No meu caso, não estava satisfeito com a maneira como a minha vida era encaminhada e comecei uma outra faculdade no ano seguinte — ‘a primeira graduação é pra arranjar emprego, a segunda é por diversão!’: esse é meu lema de vida.

Feliz aniversário de 10 anos, color bars.

Ouça: Spotify, Apple Music.

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SAYONARA-NOSTALGIA

Queria dizer adeus-nostalgia, amanhã seremos mais jovens do que hoje.